quarta-feira, 27 de abril de 2022

intervalo

entre uma coisa e outra existe um espaço de tempo. um vazio, simplesmente, para quem não enxerga nada lá. mas é nesse espaço que tudo está silenciosamente presente, tudo o que é invisível e impalpável, tudo o que queremos e não queremos, tudo fluindo em ebulição.

uma pausa que aparece como uma oportunidade de mudar o ser e o estar. um intervalo importante, como uma noite de sono que não podemos escapar.

pausas pequenas, pausas grandes. todas elas indicando que algo está por vir, como um prelúdio.


ouvindo: dancing in the dark - chase eagleson

sábado, 16 de abril de 2022

saco preto

estou arrumando meu armário desde o começo da pandemia. cada peça de roupa é uma reflexão. a blusa de lã de dezoito anos atrás que foi pra doação, aquela bolsa que carreguei por oito anos, minha companhia de todos os dias, que resolveu abrir um rombo e recusou todos os remendos que tentei fazer. quem sabe alguém possa costurar impecavelmente bem e faça uma restauração nessa bolsa velha. aquele sapato estiloso que tentou me jogar no trilho do trem, não confio mais nele. doação. aquela bolsinha de ursinho, infantil e inútil que nunca coube nada, vai para alguma criança boba. aquela calcinha que eu usei duas vezes, parecia que o pano era bom mas na última lavagem virou fiapos. tem também aquela camiseta que me deixa feia. tentei combinar com todo tipo de calça, tênis e blusa, mas no fim das contas não era uma boa camiseta mesmo, talvez fique bem em alguém que não ligue pra qualidade, caimento nem nada disso.

as gavetas vão ficando vazias, o saco de roupas se contorce em júbilo ao ver a situação. essas roupas não estarão mais aqui amanhã, vão para a doação anônima lá da igreja. deixo o vazio estar, simplesmente. agradeço a oportunidade de adquirir novas roupas e ter onde guardá-las. talvez eu lembre de uma coisa ou outra daqui um tempo, mas não acho que isso fará muita diferença no panorama geral das coisas.

entrego o saco preto ao homem que fica lá na porta, que gentilmente me agradece e o leva embora até eu perdê-los de vista. entro no meu carro e sigo leve pra casa.


ouvindo: push - the cure

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

alívio

roupa pinicando. há alguns anos. a força do hábito é uma bosta às vezes. é necessário criar um vazio para que o buraco seja preenchido com outro material. é necessário doar o suéter de lã para que o armário seja preenchido com um bom moletom.

combina com meu tênis. alívio. adequação. será que alguém ainda gosta de lã? tomara que aquilo sirva em alguém. ou tomara que não.


ouvindo: final days - michael kiwanuka

sábado, 25 de dezembro de 2021

vizinhança

quando eu era pequena havia, na vizinhança, uma casa da qual eu apreciava muito. era uma casa bem grande, bonita, com um belo jardim entornando-a. contemplar a sua vista me gerou boas lembranças, apesar de eu nunca ter morado lá.

recentemente, passando por ela, percebi que o lugar continua o mesmo. apesar de eu ter gostado dessa casa no passado, isso me gerou uma leve decepção. isso aqui me parece um pouco antiquado. e eu achei que a construção, como um todo, era maior. eu cresci, será?

o jardim também não tem nada de mais. ainda assim, não convém criticar um jardim que possui um só tipo de planta. ao menos me parece um jardim esforçado.

e assim, a imagem da bela casa se despedaçou na minha memória. servindo pra compreender a limitação de uma criança e suas poucas referências. me fazendo entender, também, que eu era uma criança que via beleza nas coisas. continuo fazendo isso, só sou mais criteriosa.

que bom.

segunda-feira, 29 de novembro de 2021

vasos

homens são como vasos grandes em cima de mesas pequenas. vasos pesados de porcelana, lindos vasos.

e o que você faz com isso?

a construção social de uma vida inteira te fez apreciar esses vasos. chega uma hora que você pega um nas mãos e não sabe o que dá mais trabalho: segurar ou colocar de volta na mesinha. porque vai cair, porque é pesado, porque é frágil apesar de não parecer, porque várias coisas. quem mandou mexer também né? ele tava lá sossegado cumprindo a função dele com alegria, não foi feito pra ficar mexendo.

então você coloca o vaso de volta com cuidado, sai da sala, respira e vai fazer outra coisa. vai mexer com algo que permita maior e melhor interação. não faltam objetos para isso.

terça-feira, 9 de novembro de 2021

cão

sempre me orgulhei do seeking. e também sempre tive admiração por quem o tem. onde está a sua força? o que te faz acordar cedo pela manhã? me fale sobre seus planos, ao menos seus sonhos.

paciência. presença. empatia. simpatia. me fale sobre você, eu me interesso.

e como um cachorro eu sigo alerta, interessada, disposta. mas eu tenho pensado em morder alguém. ou melhor, eu tenho planejado. tenho treinado, tenho calejado o cão que tem a capacidade de permanecer parado e morder sem avisar. qual cão você alimenta, enfim?

rage. está aqui dentro. e às vezes aparece. e eu sou grande.

quarta-feira, 14 de abril de 2021

everything

is this the moment where i look you in the eye?
forgive my broken promise that you'll never see me cry
and everything, it will surely change even if I tell you I won't go away today

will you think that you're all alone
when no one's there to hold your hand?
and all you know seems so far away
and everything is temporary, rest your head
i'm permanent

ouvindo: permanent - david cook