sábado, 23 de agosto de 2014

gosto

você tinha gosto de lasanha, pavê com chocolate granulado, café espresso sem açúcar.

eu te punha no prato e toda contente sentia o aconchego da fartura.

repetia, comia com os olhos, ia alegre e vinha saltitando.

era legal sim, era ultra legal, muito supimpa.

é legal hoje esse efeito de café revestindo o estômago, quente e amargo. quieto. amargo.

preto, simples, quieto, amargo.

quieto é confortável. gosto disso.


ouvindo: album ok computer - radiohead

demora

eu lembro exatamente o que pensei antes de pular do bungue jump dez anos atrás. as pessoas lá embaixo tinham o tamanho de um playmobil, a montanha era mais verde e o céu mais azul do que nos teletubbies. se eu demorar muito acabo não pulando, foda-seeeee.

tinha uma escoteira que demorou muito. pensou muito. olhou muito pra baixo. claro, não pulou. não era uma questão de medo maior que a média, falta de coragem maior que a média, luta ou manifestação pelo direito de não pular. o único problema foi que ela demorou muito, mesmo, só isso.

as coisas são complicadas pra quem demora.

quando se demora, a cabeça desenvolve inúmeras coisas que não existem. infla as expectativas, o que gera ansiedade. a ansiedade trava a pessoa, e lá vamos nós: ainda mais ansiedade. quando andamos pra frente nos deparamos com problemas reais e as soluções têm que ser reais, isso é uma dinâmica boa. quando demoramos, parados, os problemas são supostos, a solução é suposta. vira uma coisa de louco.

demorar não é bom. planejamento é bom. são coisas diferentes e não podemos confundir uma coisa com a outra.

estou bastante irritada porém é altamente deselegante empurrar pessoas do bungue jump. excede os limites interpessoais.

não é à toa que a sociedade está gerando um grupo de pessoas individualistas e apressadas. simplesmente não há tempo a perder esperando os entes queridos olharem e olharem pela gaiola do bungue jump.


ouvindo: album ghost stories - coldplay

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

jardim

todo mundo precisa de um jardim secreto para se recolher.

lá você faria outras coisas, teria outros trejeitos. usaria outras roupas, comeria outros pratos. ouviria músicas acolhedoras e leria outros livros. passaria horas lendo livros e pensando sobre a vida no jardim, o obscuro risonho e doce. lá o seu corpo é o mesmo, suas feições mudam, sua postura empertiga, suas frases destoam, seu cheiro se transforma.

e no meio daquelas plantas você é outra pessoa, você muda tanto, quase chega a ser o que há de mais puro em você.

eu gosto daquela moça do jardim.

eu também gosto.

por que?

porque ela gosta de mim.


ouvindo: cold - aqualung